sábado, 9 de maio de 2015

Alta adiada



09 de Maio

No dia 29 de Abril, quando subi com a Luísa à Pediatria agarrei-me com todas as forças ao facto de que terminaríamos os 21 dias de tratamento no dia 12 de Maio, para aguentar mais esta etapa. Nesse dia iriamos finalmente para casa.

Na minha cabeça a meta era essa, o dia 12. Nesse dia nasceria uma nova vida para nós as duas. Uma vida sem cateteres, sem medidas de tensão e outros valores, sem termómetros, sem rondas diárias, sem pedidos de suplemento, sem idas a casa a correr, sem noites (mal) dormidas num cadeirão.

Mentalmente por cada dia que passava eu fazia uma cruz no calendário da minha cabeça.
A Luísa estava a ficar bem, mas eu precisava desse objetivo, dessa meta para sentir que estava cada vez mais próxima de casa.

Quando na quinta-feira passada a enfermeira me disse que um dos medicamentos da Luísa tinha sido iniciado dois dias mais tarde e que por isso a data da alta seria adiada por dois dias, mais uma vez, caiu-me tudo ao chão. Eu sei que é necessário levar os tratamentos até ao fim, eu sei que é pelo bem da Luísa, eu sei disso tudo e muito mais, mas também sei que não aguento muitos mais dias aqui, já não tenho muitas mais forças físicas nem mentais. Se custa admitir isto? Custa, custa muito. Mas eu não sou de ferro. Ninguém é. Uns conseguem é ser de alumínio e outros de inox, mas de ferro ninguém. Ao mesmo tempo arredar pé daqui nem que seja por duas ou três horas custa. É quase como dizia o Variações só estou bem onde não estou.

À enfermeira não devo ter feito uma cara nada agradada. Aliás, onde é que eu já tinha visto este filme? É que primeiro o tratamento seria de 14 dias e depois passaram-no a 21 e agora voltavam a adiar a nossa saída mesmo que por mais dois dias. Dois dias são 48 horas e 48 horas aqui dentro parecem dois séculos. O tempo não passa. Tudo muda lá fora menos nós que estamos aqui em hibernação.

Engoli em seco e continuei o dia. Ao final da tarde estava a tentar dar de mamar à Luísa, mas sem sucesso. Quando ela adormece profundamente conseguir que coma é um desafio. Não abre a boca, não dá o jeito ao corpo, mexo-lhe nos pés, nas orelhas, na cara, aperto-lhe o nariz e nada. Os nervos eram tantos que, tal como numa panela de pressão o vapor começou a sair, só que em mim em forma de lágrimas. Foi tudo junto, a frustração de não a conseguir alimentar e o desespero de ver adiada mais uma vez a nossa ida para casa.

A minha filha não tinha culpa e naquele momento eu não estava a ser uma boa mãe, mas não aguentei. Naquele momento só queria sair deste Hospital, só queria ir para casa e embrulhar-me nos meus lençóis e só sair de lá daqui a uns dias, quando tudo tivesse passado.

No dia seguinte a médica explicou-me que na segunda-feira a equipa da Pediatria estaria reunida e que iriam debater o caso da Luísa, sendo que no horizonte podiam estar três hipóteses: só ter alta na quinta-feira e completar os 21 dias de todos os medicamentos; ter alta já na terça-feira e não terminar os 21 dias do último medicamento; ou tentar antecipar algumas tomas desse remédio para conseguir ter alta pelo menos na quarta.
Agradeci a explicação, mas frisei que não iria pressionar para ter alta antes e que se tivesse de ficar até quinta-feira ficaria. Neste momento, os meus quereres são os que menos importam. Aliás agora e provavelmente para sempre. De qualquer das formas gostei muito de falar com a médica da Pediatria, tem sempre uma energia positiva.

Assim, em vez de me voltar a agarrar aos dias como meta decidi voltar à frase que repeti vezes sem conta na minha cabeça quando via a Luísa dentro da incubadora: o que vier é para mim.

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