domingo, 30 de julho de 2017

Mil perdões, senhores do Eleclerc! Mil perdões.



30 de Julho de 2017

Se ainda não jantaram parem por aqui. Vão primeiro jantar ou cear e depois voltem para ler o texto. Aviso de amiga. A sério, confiem.


Ter filhos é uma condição permanente de adaptação aos mais variados desafios. E não adianta resistir muito, porque eles vencem sempre. A vinda da Luísa trouxe-me uma capacidade de desconstruir situações complicadas ou embaraçosas, de relativizar e seguir em frente, que começo a pensar incluir “ser mãe” no meu CV como uma competência que deveria ser tida em conta.

Cá por casa andamos na fase de tirar a fralda, então damos por nós a fazer um verdadeiro arraial minhoto sempre que a Luísa faz xixi ou uma “chouriça” no pote, termo carinhoso com que apelidamos o cocó. (Temo que a cachopa daqui a uns anos não vai gostar de comer enchidos…)
No geral a coisa tem corrido bem, embora mais porque somos nós que andamos sempre a levá-la ao pote ou à sanita do que a ser propriamente ela a pedir. E depois há as abençoadas trainers, uma espécie de nem carne nem peixe na secção das fraldas, que agora são as nossas melhores amigas na hora de saídas mais prolongadas e sem a certeza de wc´s por perto.

As semanas foram passando e fomos ganhando mais confiança nela, sempre a bater nas mesmas teclas do “quando tiveres vontade de fazer xixi ou cocó pedes” ou “mesmo que estejas de trainers pede para fazeres”. Tirando uns xixis pelas pernas abaixo e um cocó nas cuecas nada dramático e nada em locais públicos. Até ao dia.

Digo-vos, as crianças são assim uma espécie de espectáculo de variedades em grande, estilo Hollywood. Se é para dar show é para dar show em grande.
Um destes dias precisávamos de ir às compras e fazer uns recados, ora enfiamos as trainers à Luísa e fomos de lista na mão ao Eleclerc. Seguríssimos que estávamos, andávamos nas calmas a pôr as coisas para o carrinho.

Estava eu de cabeça enfiada numa arca congeladora a tentar perceber os preços de uns camarões, estava o J. do outro lado do corredor a escolher uns gelados com a Luísa sentada no carrinho das compras, quando o ouço chamar por mim naquele tom de voz que já conheço de “anda aqui que há bosta”.

Levantei os olhos para ver a tragédia e juro que devo ter ficado 30 segundos a pensar que aquilo era um sonho e eu ia acordar, em verdadeira negação. Mas não havia volta a dar, o cenário era… castanho e não valia a pena chorar ou fugir (que era o que na verdade me apetecia). Era cocó por todos os lados, literalmente. O J. com ela em suspenso, levantada do assento do carrinho, e dois montes de cocó ali. Eu nem sabia por onde começar a limpar. Se a limpava a ela, se limpava o carrinho.

Fui a correr buscar umas fraldas e toalhetes e era ver-me em pleno corredor dos congelados a limpar cocó do carrinho. E dada a descarga nem sei como é que não caiu nada efetivamente nas compras, ficou tudo no assento e amparado pelas grades do encosto.

Escusado será dizer que o J. perdeu a vontade de comer o gelado e fomos de imediato pagar as compras. Entretanto não a podíamos deixar sentar-se nem encostar em nada. Era eu a pagar as compras e o J. a evitar que ela fosse para uma daquelas casinhas de plástico da Patrulha Pata que eles lá tinham. É que se ela se mexesse muito o mais certo era deixarmos mais um monte de cocó no hipermercado. E o cheiro, senhores? Um rastro de podridão à nossa passagem. Lindo.

Quando chegamos ao carro e comecei a trocá-la perdi a conta às toalhitas que gastei…e o J. tentou limpar o carrinho das compras o melhor que pôde, mas a verdade é que o cocó era tipo mousse e entranhou-se em algumas frinchas.
Nós só pensávamos nos desgraçados que iam ter o azar de pegar naquele carro logo a seguir, porque apesar de o termos limpo o melhor possível o cheiro não dava para disfarçar.

É por isso que, senhores do Eleclerc, mil perdões! Mas é muito difícil controlar os intestinos de uma criança na altura da muda da fralda. Esperamos não vos ter causado perda de clientes e em nossa defesa podemos fazer publicidade, dizendo que compramos imensa roupa para a Luísa no vosso hipermercado e adoramos os vossos rissóis e o Ricoré. Esperamos sinceramente que nos continuem a deixar fazer compras no vosso espaço e que não tenham uma foto das nossas três caras à entrada com a frase: “Proibidos de entrar.”

segunda-feira, 10 de julho de 2017

Choro-gritos-baba-ranho, a birra premium



10 de Julho de 2017

E assim sem aviso prévio, na última sexta-feira, fomos presenteados por aquele episódio que mais cedo ou mais tarde calha a todos os pais, mas que todos nós queremos fugir: a birra no hipermercado.
Para ser exata, no caso da Luísa, a birra até começou mesmo no restaurante do Pingo Doce e só depois é que tivemos direito a uma versão mais soft já dentro do hipermercado.

Estava eu sentada à mesa, Apressada enfiada na cadeira de refeição e o J. a recolher o que tínhamos pedido para o jantar, quando sua excelência me pediu água, mas queria bebê-la sozinha. Gosto muito de crianças independentes, mas sabia bem que se lhe desse a garrafa para as mãos que dali a 5 minutos estávamos a ir para casa com a cachopa ensopada e sem jantar.

Primeiro, fui-lhe buscar uma palhinha, porque a Luísa ainda se entala muito a beber da garrafa ou do copo. Depois começou o circo…
- Luísa, a mãe segura na garrafa e bebes pela palhinha.
- Não, a menina bebe sozinha.
(Sim, a minha filha é como os jogadores de futebol fala de si na terceira pessoa.)
- Não, bebes com a mãe a segurar.
- Nãaaaaaaaao. Sozinha.
- Não, a mãe segura senão vais-te molhar toda.
- Mas eu quero soziiiiiiiinha.

Abre a goela e começa o choro, berros, gritos e na fase final a baba e ranho. Tudo naqueles decibéis que não escapam a ninguém e que às outras pessoas parece que estamos a torturar os nossos filhos. Eu sem levantar a voz, a dizer-lhe sempre: “Bebes, mas a mãe segura na garrafa. Não adianta chorares”. E estivemos ali no nosso braço de ferro a ver quem é que cedia primeiro.

Nesse tempo, e embora nunca tenha levantado a cabeça, no meu campo de visão eu via as pessoas a olhar, a parar, a espreitar por cima do ombro e palpita-me que mais uns minutos alguma alminha vinha lá ao pé de mim tipo salvadora da pátria e conhecedora de todas as maleitas dos mais pequenos (mas ainda bem que não o fez, senão provavelmente eu não iria responder polidamente…).

Que vergonha, minha gente. Que vergonha! Se eu já temia este momento, agora é que simpatizo com os outros pais que já passaram ou passam por isto.
Até que chega o J. com os tabuleiros e aquele ar de podem-dar-me-uma-pá-para-escavar-um-buraco-e-desaparecer e diz-me para lhe dar a garrafa. Com a chegada da sopa também foi mais fácil desviar a atenção dela da água, mas de 30 em 30 segundos voltava a pedir a água e a ameaçar nova birra premium. Ela era lágrimas a molhar a t-shirt, ranho a escorrer pelo nariz, cabelo todo desgrenhado, o melhor cenário que se pode desejar para um filho em público.

Lá sobrevivemos ao jantar e fomos para as compras. Sexta-feira não estava a ser o nosso dia. Ela que adora ir sentada no carrinho a ajudar a pôr as compras lá para dentro teimou que não queria ir ali, mas na parte onde efetivamente vão as compras. Nova birra. Não tão premium como a do restaurante, mas com direito a choradeira e gritos, espernear, tentar levantar-se do carro. E o J. com aquela cara de vamos-mas-é-já-embora-que-eu-estava-bem-era-a-ver-a-volta-à-frança.

Deixei-a ao cargo do J. e dediquei-me a recolher os legumes e frutas e fazer aquela cara, que muitos pais fazem, como se a filha não fosse minha por breves instantes.

Lá acabou por se acalmar ao ir comigo buscar umas flores e lá deixou as birras de vez.

Mas, pais vítimas deste flagelo, ajoelho-me perante vocês e ainda beijo o chão àqueles que não cedem e se estão marimbando se metade do concelho ficou a olhar para vocês e se vão ser tema de conversa de café na manhã seguinte: “Ai, havias de ver ontem a filha de X aos berros no hipermercado. Aquilo é criança sem regras, sem mão.”

Fiquei uns dias a pensar no episódio e, por acaso, sem pesquisar deparei-me com dois textos sobre birras, um de um pediatra e outro do António Raminhos, zero de formação académica em Pediatria mas pai de três crianças (a mim basta-me), e as minhas conclusões são as seguintes: não ceder (conselho do pediatra) apesar do show gratuito e na loucura descer até ao nível delas e fazer uma birra também (conselho do Raminhos).

Por isso, se me virem qualquer dia a espernear no chão de um hipermercado ou a chorar baba e ranho agarrada a uma caixa de brinquedos sou eu a fazer uma birra premium que talvez envergonhe a minha filha, como a dela me envergonhou a mim, e ela aprenda a lição.

E se isto fosse um vídeo finalizava com o refrão de uma música dos Rolling Stones: You can´t always get what you want.