quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

Em casa de ferreiro, sapatos de pau



07 de Dezembro

Uma pessoa passa o dia a olhar para sapatos, a pensar em sapatos, a calçar sapatos.
Uma pessoa vai às lojas comprar sapatos e anda a passear-se por lá cheia de tiques a ver se a pele está boa, se os sapatos descalçam ao caminhar ou se apertam, se os saltos estão direitos, se são feitos na China ou em Portugal, se têm ares de durar uma época ou a vida inteira.
Uma pessoa perde horas intermináveis a suspirar por Pradas, Valentinos ou Louis Vuitton na net. Nunca terei dinheiro para os comprar, mas vê-los ainda não paga imposto.
Chega a hora de se comprar uns sapatos para a filha e uma pessoa sente-se perdida, não sabe o que comprar, é uma tragédia, parece que nunca vimos uns sapatos na vida.

Verdade, verdadinha.

Se eu contabilizasse o tempo que já perdi a ler, a pesquisar, a consultar sites e a ouvir médicas e enfermeiras sobre como comprar calçado para criança e quais as marcas a comprar os meus caríssimos leitores e leitoras ficariam admirados.

A verdade é que saber que raramente uma criança nasce com problemas nos pés e que ao longo da vida pode ficar com malformações, apenas e só, por culpa dos sapatos que se usa, é coisa que me assusta. Daí que a escolha do par de sapatos “perfeito” tenha sido e continue a ser uma grande Odisseia. (Estou em crer que o Ulisses há-de chegar primeiro a Ítaca que eu encontre o par perfeito…)

Olhem só a lista mental que eu levava, quando fui comprar há uns meses umas botas para a Luísa: não comprar sapatos grandes demais com aquela esperança de que durem mais tempo, porque ao não flectirem no local certo podem magoar ao caminhar; optar por materiais que deixem os pés “respirar”, dando preferência à pele em vez de sintéticos; serem confortáveis (conforto primeiro, design depois); ter contraforte rígido e moldado que proporcione uma boa postura; palmilha ergonómica em pele que molde a planta do pé. Pouca coisa, não é? Saudades de quando se chegava a uma sapataria e apenas se dizia que se queria umas botas azuis…

Com todas estas coisas na cabeça comecei em busca do par perfeito, ou melhor, da marca perfeita. Geox, Chicco, Clarks, Kickers, Dr Martens, Beppi, Pablosky, Biomecanics da Garvalín, Agatha Ruiz de la Prada, Pikitri, marcas próprias da La Redoute e Vertbaudet, RAP… you name it.

Vi tanta coisa, consultei tantos sites, que no final me senti tão perdida e me fui refugiar na Chicco, tentando convencer-me a mim mesma que uma marca com tanta fama (marketing!!!) não me podia desiludir.

Bem, na verdade é que até acho que fiz uma boa compra. As botas que comprei à Luísa são bem reforçadas, ajudando a corrigir a tendência que a Luísa tem em pôr para dentro o tornozelo esquerdo. O modelo é todo feito em pele e a palmilha, não tendo o aspeto de uma habitual palmilha ergonómica, tem uns pontos num material diferente que, segundo a enfermeira do Centro de Saúde, fazem o mesmo efeito que as palmilhas com aquele altinho picotado no meio. E não foram exageradamente caras...

No entanto, confesso que a marca que mais atenção me chamou foi uma marca espanhola, que me deu a conhecer a Pediatra: a Biomecanics. O problema? Dois. O preço e o facto de tanto os sapatos como as botas parecerem…tratores…
Basicamente a Biomecanics resulta de uns estudos efetuados por um instituto ou faculdade de Valencia que desenvolveram uma espécie de reforço na zona do calcanhar e tornozelo, que permitem um melhor apoio a caminhar. Com tanta borracha naquela zona, não duvido que não haja tornozelo que saia do sítio, mas que os sapatos não ficam lá muito bonitos, não ficam. São o verdadeiro conflito entre o conforto e design.

Neste momento estou à espera dos saldos para mandar vir um par pelo site para testar, já que nas redondezas ainda não descobri sapataria com esta marca.
O bom desta pesquisa é que descobri que a mesma fábrica da Biomecanics também produz as marcas Garvalín (uma gama mais em conta) e a Agatha Ruiz de La Prada (que não sendo barata é mais fácil de encontrar, porque conheço uma loja aqui perto que vende a marca), ambas com bons níveis de qualidade. 

Assim a novela «Sapatos/Botas da Luísa» está para durar, em busca do par perfeito…desde que não sejam de pau… e cristal só mesmo os da Cinderela feitos pela Vista Alegre, que estão no Museu do Calçado






terça-feira, 11 de outubro de 2016

#4 É a vida, Ana! Planos há muitos



11 de Outubro

Hoje era daqueles dias que eu tinha tudo planeado ao minuto. Sair do trabalho, ir comprar umas coisas que me faltavam, levantar uma encomenda, chegar a casa, preparar o jantar, arrumar quatro pilhas de roupa, dar o jantar à Luísa, brincar um bocado com ela, começar a separar as coisas de Inverno, juntar as peças de roupa que me emprestam para a Luísa e devolver, preparar as coisas para o dia seguinte para não andar sempre a correr antes de sair para o trabalho. E no final de tudo, qual descanso da guerreira, sentar-me uma hora no sofá a ver uns dois ou três episódios de Friends (obrigada, Netflix!).

Pois. Balelas. Tretas.
Mas que raio tem o mundo contra os meus planos? Ah… sou mãe e o mundo organizadinho em que eu vivia já não existe. Puff! Varreu-se. Agora é um ser de quase 80cm que gere o meu dia. Porreiro, pá.

Cheguei a casa e a minha Apressada estava a dormir. Tinha andado no passeio com o pai e nada de ter feito a sesta da tarde. Ainda assim estava tudo encaminhado para cumprir tudo o que queria fazer. O J. saiu para o ginásio e… começou o apocalipse.

Acordou a chorar, toda lavada em lágrimas. Peguei nela, tentei consola-la, mas nada. Ofereci-me para cantar, coisa que a costuma acalmar e chorou ainda mais. É certo que não canto lá grande coisa, mas a Luísa sempre achou piada à minha voz fino-esganiçada. Liguei o santo canal Panda, mas desta vez nem esse milagreiro me valeu. Mal começaram os Parabéns – música que a Luísa adora – aumentou o volume do choro.

Dói-te a barriga? Dói-te a cabeça? Tens calor? Doem-te os dentinhos? Queres comer? Dói-te o pé? Tentei de tudo. Já estava a ficar meio desesperada. Nestas fases em que eles não sabem explicar o que têm, uma pessoa sente-se pequenina, impotente.

Só estava bem ao meu cólo. Não a conseguia pôr no chão nem na cadeira nem no tapete. Agarrava-se ao meu pescoço. E o tempo a passar e eu a stressar porque não conseguia perceber o que a rapariga tinha e a ver mentalmente os itens da minha lista de tarefas a evaporarem-se, e o jantar que ainda não estava feito. Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh!

Depois de muito mimo lá acalmou um bocado, mas dar mais de três passos da beira dela estava complicado. O jantar lá se fez, mas o resto…

A todas vocês que trabalham oito horas ou mais por dia, chegam a casa e ainda levam com mais três ou quatro horas de “trabalho” em cima e que estão constantemente a adaptar horários e planos, fiquem a saber que os meus pensamentos estão com vocês.

Vocês são do CARAÇAS! Vocês são as MELHORES!

Agora vou só ali desmaiar na cama, que tanto cólo acordou o meu nervo ciático.

É a vida, Ana!

sábado, 1 de outubro de 2016

Uma bucha goela abaixo



01 de Outubro

Nós, Portugueses, temos uma espécie de obsessão com a comida, como se a comida fosse a resposta para tudo. Eu até conheço pessoas que quando recebem visitas e se estas não enfardam (literalmente) um prato cheio de comida e se não saem de lá com ares de enfartamento levam a mal.

Então no que toca a bebés o tema comida é extremamente delicado. Um bebé que não exiba vários refegos e não concorra para boneco da Michelin é logo alvo de comentários, como: “O leite da mãe deve ser fraquinho. / Coitadinha(o), não lhe dão comida que chegue./ Toma leite de lata e não engorda./ Devem fazer-lhe uma sopita leve.” E o diabo a sete.
Eu já vi de tudo. Bebés que comiam bem e eram magrinhos, bebés que comiam mal e eram roliços.

No que toca à Luísa, e nesta fase em que ela já come praticamente de tudo, a regra cá por casa é abusar nos legumes, frutas, na carne e peixe e evitar ao máximo o pão, as bolachas e coisas que possam ter muito sal ou açúcar escondidos. Está na altura de educar o paladar e confesso que sobretudo o açúcar é coisa que gostava de manter ao longe o máximo de tempo possível… Claro que fora de casa pouco controlo a alimentação dela, mas tanto a minha sogra como a G. cozinham super bem e têm imenso cuidado com as coisas que lhe dão. Embora tenham mais tendência para lhe dar pão ou bolachas do que eu…

A Luísa não é uma criança gorda, mas também não acho que tenha cara de quem passa fome.
Ontem, durante as compras, ia o J. a empurrar o carinho com ela sentadinha e entretida com os seus botões e vinha eu atrás a ler a lista e a ver o que me faltava, quando ao passar na fila do talho uma senhora basicamente lhe enfiou um pedaço de pão boca dentro. A minha filha nem a viu chegar, nem lhe pediu nada. A senhora que estava com (presumo eu!) a filha, na fila para a carne, comendo cada uma alegremente o seu pão, deve ter achado que a minha Apressada estava com fome e vai daí toca a enfiar comida goela abaixo à criança.

O J. até se assustou com o aproximar da senhora, porque não contava com tal assalto. E eu, cuja vontade foi tirar logo o pão da boca da criança, confesso que só não o fiz, porque olhei para as duas mulheres e vi que na cara delas foi como se tivessem cumprido uma missão de vida: alimentar criancinhas.

Escusado será dizer que dois corredores à frente lhe tirámos o pão, até porque ela nem estava interessada nele, trincava e cuspia fora.

Agora a sério. Mas que raio de ideia dá a esta gente de dar comida a uma criança sem consultarem os pais primeiro? E se a minha filha fosse celíaca e o pão levasse trigo, por exemplo? Assim como poderia ser alérgica a qualquer outro alimento que lhe enfiassem goela abaixo.
Eu não conhecia a senhora de lado nenhum. Sei lá de onde tirou ela o pão ou onde andou com as mãos antes?

Caramba, parem de dar comida às crianças por desporto e nem me venham com a história de que ficam augadas. Em pequena o meu pai nunca me deixava comer algodão doce nas festas e eu não morri por isso. Aliás, visto bem a coisa ele até me poupou a várias “overdoses” de açúcar e eu sou uma pessoa com grande tendência para a doçura…

Em oposição, na semana passada, uma senhora tinha feito aquilo que eu considero correto. Primeiro, era uma pessoa conhecida e não alguém que nos caiu ali de para-quedas, depois dirigiu-se a mim e ao J. perguntando se queríamos dar um bocado do bolo dela à Luísa. Nós agradecemos e dissemos que não era preciso, ela não estava com fome e tinha comido a fruta há pouco. Claro que a Luísa só para nos deixar mal, virou-se para a senhora e só disse uns 300 dá-dá-dá logo após termos recusado a oferta. Lá tivemos de arrancar dois pedaços do bolo da senhora e dar-lhe.
Mas foi uma situação controlada, assim como noutros casos recusamos comida ou porque a Luísa já tinha comido bastante ou por serem coisas que ainda não come, como por exemplo chocolate.

Queridas e queridos alimentadores de criancinhas indefesas, se estão a ler este texto, por favor, da próxima vez que qual Miss Universo vos passar pela cabeça a ideia de erradicar a fome do mundo, começando pela criança mais próxima, pensem bem, e só por respeito aos pais, perguntem primeiro se podem, OK?