10 de Julho de 2017
E assim sem aviso prévio, na última sexta-feira, fomos
presenteados por aquele episódio que mais cedo ou mais tarde calha a todos os
pais, mas que todos nós queremos fugir: a birra no hipermercado.
Para ser exata, no caso da Luísa, a birra até
começou mesmo no restaurante do Pingo Doce e só depois é que tivemos direito a
uma versão mais soft já dentro do hipermercado.
Estava eu sentada à mesa, Apressada enfiada na
cadeira de refeição e o J. a recolher o que tínhamos pedido para o jantar,
quando sua excelência me pediu água, mas queria bebê-la sozinha. Gosto muito de
crianças independentes, mas sabia bem que se lhe desse a garrafa para as mãos
que dali a 5 minutos estávamos a ir para casa com a cachopa ensopada e sem
jantar.
Primeiro, fui-lhe buscar uma palhinha, porque a
Luísa ainda se entala muito a beber da garrafa ou do copo. Depois começou o
circo…
- Luísa, a mãe segura na garrafa e bebes pela
palhinha.
- Não, a menina bebe sozinha.
(Sim, a minha filha é como os jogadores de futebol
fala de si na terceira pessoa.)
- Não, bebes com a mãe a segurar.
- Nãaaaaaaaao. Sozinha.
- Não, a mãe segura senão vais-te molhar toda.
- Mas eu quero soziiiiiiiinha.
Abre a goela e começa o choro, berros, gritos e na
fase final a baba e ranho. Tudo naqueles decibéis que não escapam a ninguém e
que às outras pessoas parece que estamos a torturar os nossos filhos. Eu sem
levantar a voz, a dizer-lhe sempre: “Bebes, mas a mãe segura na garrafa. Não
adianta chorares”. E estivemos ali no nosso braço de ferro a ver quem é que
cedia primeiro.
Nesse tempo, e embora nunca tenha levantado a
cabeça, no meu campo de visão eu via as pessoas a olhar, a parar, a espreitar por
cima do ombro e palpita-me que mais uns minutos alguma alminha vinha lá ao pé
de mim tipo salvadora da pátria e conhecedora de todas as maleitas dos mais
pequenos (mas ainda bem que não o fez, senão provavelmente eu não iria
responder polidamente…).
Que vergonha, minha gente. Que vergonha! Se eu já
temia este momento, agora é que simpatizo com os outros pais que já passaram ou
passam por isto.
Até que chega o J. com os tabuleiros e aquele ar de
podem-dar-me-uma-pá-para-escavar-um-buraco-e-desaparecer e diz-me para lhe dar
a garrafa. Com a chegada da sopa também foi mais fácil desviar a atenção dela
da água, mas de 30 em 30 segundos voltava a pedir a água e a ameaçar nova birra
premium. Ela era lágrimas a molhar a t-shirt, ranho a escorrer pelo nariz,
cabelo todo desgrenhado, o melhor cenário que se pode desejar para um filho em
público.
Lá sobrevivemos ao jantar e fomos para as compras.
Sexta-feira não estava a ser o nosso dia. Ela que adora ir sentada no carrinho
a ajudar a pôr as compras lá para dentro teimou que não queria ir ali, mas na
parte onde efetivamente vão as compras. Nova birra. Não tão premium como a do
restaurante, mas com direito a choradeira e gritos, espernear, tentar
levantar-se do carro. E o J. com aquela cara de vamos-mas-é-já-embora-que-eu-estava-bem-era-a-ver-a-volta-à-frança.
Deixei-a ao cargo do J. e dediquei-me a recolher os
legumes e frutas e fazer aquela cara, que muitos pais fazem, como se a filha
não fosse minha por breves instantes.
Lá acabou por se acalmar ao ir comigo buscar umas
flores e lá deixou as birras de vez.
Mas, pais vítimas deste flagelo, ajoelho-me perante
vocês e ainda beijo o chão àqueles que não cedem e se estão marimbando se
metade do concelho ficou a olhar para vocês e se vão ser tema de conversa de
café na manhã seguinte: “Ai, havias de ver ontem a filha de X aos berros no
hipermercado. Aquilo é criança sem regras, sem mão.”
Fiquei uns dias a pensar no episódio e, por acaso, sem
pesquisar deparei-me com dois textos sobre birras, um de um pediatra e outro do
António Raminhos, zero de formação académica em Pediatria mas pai de três
crianças (a mim basta-me), e as minhas conclusões são as seguintes: não ceder
(conselho do pediatra) apesar do show gratuito e na loucura descer até ao nível
delas e fazer uma birra também (conselho do Raminhos).
Por isso, se me virem qualquer dia a espernear no
chão de um hipermercado ou a chorar baba e ranho agarrada a uma caixa de
brinquedos sou eu a fazer uma birra premium que talvez envergonhe a minha
filha, como a dela me envergonhou a mim, e ela aprenda a lição.
E se isto fosse um vídeo finalizava com o refrão de
uma música dos Rolling Stones: You can´t always get what you want.
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