domingo, 7 de agosto de 2022

O Archei partiu, mas há Monstros debaixo da cama

07/08/2022

O Archei partiu. Já não está cá e, segundo os médicos, já não estaria desde que lhe foi declarada morte cerebral. Estado difícil de um pai ou mãe aceitar, quando se vê um filho sereno, ainda que ligado a máquinas numa cama de hospital, como se estivesse em casa a dormir na sua cama pronto para acordar.

Comecei a acompanhar a triste história do Archei há cerca de uma semana através d´Observador. Os contornos não sou simples nem fáceis de entender ou aceitar. Teria aquela criança provocado a própria desgraça ao cumprir um dos muitos desafios estúpidos, que se multiplicam nas redes sociais? Seriam estes pais vigilantes do filho e vítimas, também eles, de um triste acidente? Ou deixariam que a criança passasse horas agarrado às redes sociais sem supervisão?

Tudo questões que se levantam e que na ânsia de se explicar uma morte tão prematura, temos tendência a procurar respostas para explicar o que talvez seja inexplicável e que causa a maior dor que um pai e uma mãe possam sentir. Acho que nunca saberemos.

Mas nesta história, o que me chocou tremendamente esta semana foi a falta de EMPATIA e de NOÇÃO de pessoas, que escondidas atrás de um ecrã vi fazerem comentários no Instagram do Expresso à notícia com: “Seleção natural” e “Darwinismo no seu melhor”.

Uma CRIANÇA está em morte cerebral, uma vida toda pela frente está prestes a cessar, há uma família que não se quer despedir de um seu ente querido e luta com todas as esperanças para prolongar a sua presença entre nós e há pessoas que conseguem friamente ler estas notícias, acompanhar este drama e fazer estes comentários? MONSTROS. Não consigo expressar-me de outra forma.

São os novos Monstros debaixo da cama, que agora se escondem atrás de um ecrã, para destilar amargura e maldade sem limite, porque até o Bicho-Papão teria mais simpatia e amor pela desgraça desta criança e à noite, quando fosse hora de sair debaixo da cama, iria dar um beijo na testa daquela criança, porque o eterno susto ela já o tinha tido e agora só precisava de um amigo e muito amor até ao último suspiro.

 

Empatia e inteligência emocional fazem falta a muita gente.

 

 

 

sábado, 5 de março de 2022

O recreio da solidão

 

Sempre adorei a escola. Sempre gostei de aprender coisas novas a cada folhear de página dos manuais. O giz que sujava as mãos, o leite escolar que nunca bebia por vergonha. Ser chefe de turma, quando me portava bem. O almoço na cantina, a custo, mas que comia rápido para ter mais tempo para brincar. Os amigos.

Mal tocava a campainha íamos todos em correria para o recreio brincar. Ainda hoje tenho amigos desses tempos. Brincávamos às caçadinhas e às escondidas, ao elástico e à macaca e quando os rapazes estavam de bom humor até nos deixavam dar uns chutos na bola. O meu “My First Sony” vermelho, azul e amarelo era uma presença frequente na escola, com cassetes dos Onda Choc para ensaiarmos danças.  

 

Na minha turma havia vários grupos de amigos, mais ou menos afinidades, mas não me lembro de alguém andar só. Os anos também já vão distantes e as memórias da infância tendem a ser pintadas de cor de rosa. Mas sinceramente não me lembro de meninos a deambular sós pelo recreio.

 

Mas hoje em dia parece que ser criança é mais difícil que no meu tempo.

 

Ainda se ensina que somos todos diferentes e todos iguais, fala-se muito no bullying e muito nos afetos, mas o menino que é novo na escola, a menina que tem uma caraterística diferente ainda andam sós na hora do recreio. Há grupos de amigos que não aceitam receber um membro novo ou se o aceitam é para que esse membro seja uma espécie de súbdito dos outros. Ouvem-se insultos entre crianças e não são raras as vezes em que se batem.

 

Eu ouço estas histórias e o meu coração de mãe fica pequenino, mirrado, a imaginar uma criança sozinha num recreio, a pedinchar alguém que queira brincar com ela e num universo de dezenas de meninos e meninas não haver ninguém (ou haver muito poucos) que o recebam com um sorriso e incluam nas brincadeiras um novo amigo. Um recreio deve ser o expoente máximo da felicidade de uma escola!

 

Então a minha questão é: onde é que nós, pais e restante comunidade escolar, estamos a falhar? É uma questão que me assola e não consegui ainda chegar a uma conclusão. Se desde o berçário e jardim de infância são feitas atividades ou trabalhos sobre a empatia e os afetos, para onde vai toda essa “pedagogia” depois? Somos nós, pais, que não falamos o suficiente com os nossos filhos, que achamos que aos nossos isso nunca acontece? Quer os nossos filhos sejam o que anda sozinho a vaguear pelo recreio ou o que nega amizade a outro menino.

Será a crueldade uma coisa inata, vinda da sobrevivência das espécies, e que apesar de tanto discurso sobre a empatia cai em saco roto na hora de estabelecer hierarquias de recreio? Será que a nossa humanidade nos tornou mais egoístas, incapazes de ver o outro, fechadinhos na nossa concha?

 

Se alguém se quiser associar a esta minha reflexão sintam-se livres para ajudar a entender o problema e procurar soluções. Porque não há coisa mais triste que um recreio de solidão.

 

quinta-feira, 23 de abril de 2020

Parabéns Luísa!


23 de Abril



Todos os clichés do mundo cabem na maternidade e o que o tempo passa rápido é um deles.
A nossa Luísa fez 5 anos esta semana e que viagem tem sido.  

Quando toda esta “história” do covid-19 começou nunca nos passou pela cabeça que a 21 de Abril ainda estaríamos a lidar com o confinamento e que a festa de aniversário teria de ser uma versão mais pequenina do que a que lhe gostaríamos de ter proporcionado.

Normalmente fazemos uma festa com a família mais próxima e amigos e chegamos a ter quase 40 pessoas cá em casa, mas este ano teve de ser uma versão reduzidíssima. Custou um bocado não ter cá as minhas avós a cantarem os parabéns à bisneta e toda a restante família e amigos. Mas foram muitos os telefonemas e videochamadas que ajudaram a encurtar a distância e animar o dia. Inclusivamente um dos amiguinhos da escola da Luísa fez-lhe um desenho de parabéns, que a mãe mo mandou pelo Whatsapp. Foi um gesto muito bonito e a Luísa gostou muito (Obrigada Simão!).

Agora só esperamos que tudo isto passe rápido para fazer uma festa grande, como os 5 anos da Luísa merecem.




terça-feira, 14 de abril de 2020

A tecnologia do…lápis

14 de Abril


Eu não sei explicar isto, mas quem ao longo da vida tem tido a oportunidade de ver várias gerações de crianças crescerem sabe que a cada geração que passa a evolução acontece. Os meus primos mais novos, com pouco mais de quatro anos já tinham mais destreza que eu com a mesma idade (lembro-me do João pequenino, apanhar o carro da minha madrinha com porta aberta, sentar-se e ligar o carro!) e a Luísa com quatro anos já me fez questões (“O que é a morte?” ou “Qual foi a primeira pessoa a nascer antes de haver mães”?) que eu acho que só pensei nelas já na escola primária. 

Hoje em dia não é estranho colocar um tablet na mão de uma criança pequena para perceber que ela rapidamente consegue descobrir a lógica do ecrã táctil e começar a associar símbolos sem saber ler. É óbvio que essa rapidez tem a ver com o facto de nos verem “agarrados” aos telemóveis e a mexer neles com os dedos. Evoluímos, mas também nem tanto, a imitação continua a ser, a meu ver, a base da aprendizagem nestes primeiros anos.

A realidade do teletrabalho cá por casa faz de nós presentes, embora ausentes. Estamos dois adultos sentados ao computador em nossa casa, mas durante muitas horas não podemos dar a atenção necessária que uma criança pequena exige. Num desses dias, o Jorge teve uma ideia “brilhante” (sim, com aspas): “Luísa queres jogar no computador?”. Eu só lhe disse que ele tinha acabado de abrir a caixa de Pandora e que não sabia onde se havia metido.

Lá lhe mostrou o rato, o teclado, arranjou-lhe uns jogos rudimentares, mas como todos sabemos os miúdos rapidamente interiorizam isto das tecnologias e passam a querer viver para jogar. Agora é vê-la todos os dias mal acorda chatear o pai, mesmo melga, até ele se comprometer em que hora do dia é que ela vai puder jogar PC. Se antes cá em casa se ouvia mais “Mãe, mãe, mãe!”, agora é “Pai, já posso jogar?”, mas de cinco em cinco minutos. Eu avisei-o.
Eu pessoalmente só pensava introduzir o computador na vida da Luísa mais tarde. Aos quatro anos nenhuma criança precisa de jogar computador. Chamem-me velha, chamem-me retrógrada, mas é verdade.

Sabem que tecnologia uma criança com quatro anos precisa de dominar? A pega do lápis, meus queridos, tão simples quanto isso. Saber pegar corretamente num lápis é essencial, é básico. É nisso que nos devemos concentrar, em vez de querer que eles saibam identificar o símbolo do Youtube ou dos jogos e fiquem anestesiados horas.  

A pega do lápis de forma correta vai ajudá-los a melhor começar a fazer grafismos, para depois fazerem letras e aprenderem a juntá-las em palavras. Há uns tempos em conversa com uma professora primária ela me confessava isso, que ainda há crianças a chegar à escola sem conseguir pegar bem num lápis. Imagino que isto seja um bloqueio logo nos primeiros tempos de primária e para uma coisa que nos leva a algo essencial da nossa vida: a escrita.

Eu não sou professora (decerto algumas que conheço podem deixar aqui os seus conhecimentos e experiências), mas do meu humilde bom senso, acho que a escrita desenvolve raciocínio, concentração, comunicação. Ui, podia estar aqui horas a falar das mais-valias da escrita. Quem nunca se arrepiou a ver erros ortográficos ou de sintaxe nas redes sociais? Tudo isso começa na escrita e os seus primórdios são…a pega do lápis. Pasmem-se.

Carregar em teclas qualquer um faz. Não menosprezando, a minha avó Alice hoje com 86 anos e a quarta classe aprendeu a teclar e uma vez mandou um mail à minha mãe! É um feito digno de louvor na verdade, mas se calhar se tiver de fazer uma redação já se via à rasca.

Pegar num lápis é difícil, demora tempo, exige muito treino e paciência. É por isso tão importante todos os desenhos que eles fazem no infantário/pré-escola/creche/casa. É por isso tão importante que todos nós, pais, levemos meia dúzia de lápis e papel sempre que formos a um restaurante, por exemplo. A criança poderá estar apenas dez minutos a pintar e logo a seguir perder o interesse, mas serão sempre uns dez minutos preciosos.

Às vezes sinto que os tablets, os computadores são uma porta à facilidade. A tecnologia tem imensa coisa boa, já não podemos viver sem ela obviamente e irá acompanhar a vida dos nossos filhos. Mas há coisas básicas que embora pareçam pré-históricas não podemos descuidar, como a "tecnologia" do lápis.

Cá por casa vamos continuar na luta entre meia hora de jogos de computador por dia, até porque agora já não dá para fazer reset na memória da miúda, e continuar a colecionar e incentivar os desenhos da quarentena para que um dia a Luísa saiba escrever tão bem, como usar um computador.

quinta-feira, 26 de março de 2020

Dois computadores numa mesa.


26 de Março



Hoje tive a prova da importância do desenho na vida de uma criança como forma de expressão, como registo do seu dia-a-dia, do ambiente que a rodeia. Mas foi uma prova que me doeu.
Estou com a Luísa em casa desde que a escola dela fechou e o Jorge juntou-se a nós esta semana.

Ambos em teletrabalho transformamos a nossa mesa da sala – aberta na sua extensão total – no nosso posto de trabalho. Ele dum lado, eu do outro. No resto da sala reinam as princesas, um urso cor-de-rosa gigante, um cavalo de baloiço, plasticinas, desenhos, jogos. Nós, os adultos, somos a ilha de aborrecimento no meio do mundo de fantasia em que se transformou a sala.

Hoje a Luísa sentou-se a “trabalhar” na mesa dela e poucos minutos depois veio-me mostrar o resultado do trabalho dela. Era uma folha em branco, onde desenhou uma mesa com computadores, eu de um lado e o pai do outro, ao lado ela sozinha. Sozinha. Longe do mundo do trabalho, que nos ocupa o dia todo. Quase me vieram as lágrimas aos olhos. Depois foi mostrar ao pai. Demos-lhe muitos beijinhos e abraços e dissemos-lhe que o desenho estava muito bonito. Eu sempre com o meu cabelo que ela diz que é vermelho, o pai em frente a um ecrã enorme. Pura realidade. O desenho era o espelho da nossa manhã, da nossa semana.

Nunca estivemos tanto tempo com a Luísa dentro de casa, mas ao mesmo tempo nunca estivemos tão ocupados e absorvidos em trabalho. E a nossa menina lá se vai entretendo, sozinha, mesmo que às vezes ouça “Agora não, Luísa!” e até nem se queixa muito, vai entendendo este trabalho caseiro. Faz desenhos, vê filmes, veste-se de princesa, marca o dia do mês num calendário como faz na escola, vem-me dizer rimas ou lengas-lengas, pedincha jogos de computador ao pai (isto dará outro texto um dia destes!).

Nós procuramos dedicar-lhe momentos só para ela ao longo do dia, como a caminhada “higiénica” lá fora após o almoço ou 30 minutos de ginástica que faz com o pai ao final da tarde. Mas é pouco. Virão alturas em que o trabalho afrouxará, mas por agora quer o Jorge quer eu temos de nos dedicar aos nossos trabalhos. Ninguém vive só do ar que respira e felizmente temos trabalhos, que salvo algumas excepções, conseguem ser feitos desde casa.

Mas depois de um desenho daqueles ficou-me um amargo de boca. Gerir família e trabalho, tudo no mesmo espaço não é fácil, embora pareça. Quantos pais não se estarão a sentir assim, como que se estivessem a colocar trabalho à frente dos filhos?

A todos os pais em teletrabalho, que tiveram reuniões com os filhos ao cólo ou atenderam um telefonema enquanto assoavam um nariz, que deixaram um e-mail a meio para dar o lanche da manhã ou mudar uma fralda, um beijinho de camaradagem e um xi-coração apertadinho.
No final, vamos ficar todos bem, não é assim?


Que venha o fim-de-semana sem teletrabalho.

P.S. A imagem que coloquei é o desenho feito pela Luísa.

sábado, 21 de março de 2020

O guião de filme que se tornou realidade


21 de Março 2020

Uma semana de quarentena em casa. Sobrevivemos.

Quase todos os dias acordo a pensar se esta história do Covid-19, para os amigos Coronavírus, é verdade. Depois basta ligar a televisão para ter a confirmação.
Por outro lado, eu já tive treino de “quarentena” há cinco anos atrás, graças à Luísa apressada, e tendo em conta que na anterior tinha de ficar na cama de um hospital, acho que nesta estou a sair beneficiada…porque pelo menos me posso mexer e estou na minha casa.

O cenário é assustador, sabemos que o Sistema Nacional de Saúde não vai ter capacidade de resposta (nenhum o tem), se os casos começarem a escalar como em países como Itália ou Espanha, aqui perto. Por outro lado, temos um Governo e Presidente da República que fazem discursos vazios de conteúdo, como se num momento todos os portugueses ficassem desprovidos de inteligência. Nem falemos das medidas anunciadas. Temo que grande parte delas são “para inglês ver”.

Também não sou ingénua ao ponto de achar que se fecha tudo sem adivinhar que daí não virão consequências económicas muito graves. Sim, vai haver despedimentos. Sim, vai haver falências. E logo agora que parecia estar o país a equilibrar, pensa muita gente. Mas de que me adianta ter dinheiro no bolso se não tiver as minhas avós cá? De que me adianta ter dinheiro no bolso se eu tiver sido o elemento que contagiou outras pessoas, que por sua vez contagiaram mais umas quantas?

Este vírus tem de servir para algo, bolas! Tem de servir para sermos humanos de novo, sentirmos que a presença dos que amamos pode estar em risco e agirmos, pelo amor que lhes temos. Não podemos chegar ao ponto de ter de entregar a responsabilidade a um médico de escolher quem se salva e quem morre, quando o SNS estiver a rebentar. Porque é isso que vai acontecer se continuarmos a ter estado de emergência, mão não ter; a ter negócios obrigatoriamente encerrados, mas não ter.

O planeta já está a falar para nós, a mostrar que a regeneração é sempre possível. O que não tem solução é a morte.

Por isso Luísa, ao Governo de Portugal eu peço que não nos mintam, que sejam audazes, que não pensem politicamente (ingénua, eu sei!). Trabalhem com o tempo e não contra ele, permitam ao país parar, curar-se e quem sabe algum dia em Hollywood façam um filme sobre esta “guerra”, mas com um final feliz.



sábado, 1 de setembro de 2018

Parques infantis: O terror e o paraíso



A minha filha adora parques infantis. Eu detesto. Para ser sincera, odeio mesmo. E acho que agora entendo porque é que os meus pais nunca me levavam a parques infantis. Espertos.
Os parques infantis são território onde impera a selvajaria em detrimento da diversão ou pelo menos este é o meu ponto de vista, claro. Se perguntarem à Luísa ela dirá que adora e que é o lugar onde sobe e desce um escorrega 500 vezes numa hora e anda de baloiço.

Por norma, vem sempre de lá por arrasto e a chorar, porque nunca o tempo que lá está é suficiente. Podemos ir 15 minutos, 30 minutos ou três horas que o final é sempre o mesmo: Luísa a ser trazida ao colo, retirada à força do escorrega, a chorar baba e ranho, depois de termos estado “pacientemente” nos últimos 10 minutos a dizer “Luísa, vamos embora. É a última vez que escorregas, ok?”

Do ponto de vista das crianças acredito que realmente elas gostem daqueles espaços, quer sejam os parques de exterior como aqueles que existem nos shoppings. Hoje em dia quase todos vivemos em apartamentos com pouco espaço pelo que estas áreas com labirintos, escorregas, baloiços ou outras estruturas façam as delícias da pequenada.

Mas eu enquanto mãe e pessoa – e sublinho o “pessoa” – tenho muitas vezes dificuldade em lidar com estes sítios, aliás acho que são um bom terreno para sermos avaliados enquanto pais e cidadãos. Quando o “caudal” de crianças nesses sítios não é muito grande, dá sempre para tirarmos durante cinco segundos os olhos da nossa cria e ver o ambiente à volta. Ou então, quando estão a abarrotar pelas costuras eu diria que seriam uma delícia para qualquer psicólogo fazer um estudo… aos pais, sobretudo. Pérolas, meus senhores, muitas pérolas.

Na semana passada, num dos dias em que choveu, tive a ideia (parva) de me enfiar num shopping com a Luísa e daqueles com um desses espaços infantis, que a Luísa adora. Foi só o tempo de sair no elevador e a cachopa já me estava a sarnar a paciência com o “Vamos, mãe! Vamos.” Fui fraca e cedi. Era o Armagedão naquele espaço. Digo-vos o fim do mundo não deve ser muito pior que aquilo.

Eu diria que estariam perto de 100 crianças extremamente agitadas no espaço e das mais variadas idades. A Luísa a sentar-se no chão e já a tirar as sapatilhas e eu já a “ler” no espaço os 5.000 perigos que nos passam na cabeça. Não a podia perder de vista dois segundos, estavam imensos miúdos e outros tantos adultos à volta.

Começa então o circo.
Luísa escolhe o escorrega, sobe e desde umas quantas vezes. Já não precisa de ajuda a subir nem a descer, mas eu mantenho-me sempre por perto, porque se há coisa que as hormonas pós gravidez me deram (e mantenho) é aquela sensação de leoa a proteger a cria. Dez metros afastada de mim e sou capaz de fazer partidas em corrida capazes de envergonhar muitos atletas dos 100 metros, se a sentir em risco. Não se riam que é verdade, juro!
Ora vai a Luísa a descer e deparo-me com uma avó a ajudar o neto a subir o escorrega por onde TODAS as outras crianças estavam a descer. “Anda fofinho, sobe!” Comecei a ferver e fiz-lhe aquele olhar de ou-pões-o-fofinho-a-subir-pelas-escadas-e-a-descer-na-vez-dele-ou-vamos-ter-problemas! A ela assustei-a, não se abeirou mais do escorrega, mas ao “fofinho” claro que não, então se a avó tinha dito que era ali que se subia, porque iria ele para a fila? As crianças são o nosso espelho em muitas coisas, somos nós, adultos, que lhes passamos muitas coisas…sobretudo cidadania, respeito pelo espaço comum, you name it.

Seguiu-se o espaço da piscina de bolas, que segundo me parece penso que será até aos cinco anos. Estava lá a Luísa e mais duas ou três crianças a brincar e vejo a entrarem duas crianças com pelo menos 7/8 anos lá dentro, que quase já nem conseguiam estar em pé direitas de grandes que já eram para aquela área e começam a correr às voltas, levando os mais pequenos todos à frente. Ouço esta pérola da mãe ao meu lado: “Olha enfiei-os para ali!” E começa a rir-se. Pois, não eram os filhos dela que estavam a ser atropelados e calcados, que interessava se aquele espaço já não era para a idade/fisionomia deles? Achei esta atitude uma plena falta de sensatez, respeito e mesmo desleixo.
Lá fui eu retirar a Luísa de lá, que já estava a choramingar de ter sido abalroada e dizer àquela mãe que aquelas crianças eram grandes demais para aquele espaço. Se as tirou de lá? Nem se deu ao trabalho.

A última paragem foi a área dos ecrãs interactivos, normalmente local dos meninos e meninas que não gostam tanto do “Texas” em que se transformam os outros divertimentos. Nesse sítio a minha dificuldade é fazer entender à Luísa que se estiverem ocupados tem de esperar pela vez dela (como sabem é apressada desde a barriga) e depois quando já está a pintar há algum tempo fazê-la entender que tem de dar a vez aos de trás. Por norma, este é o espaço mais fácil de gerir, ainda assim e tendo em conta que a Luísa passa 80% do tempo na parte do “Texas”, estes ecrãs interactivos sabem-me a spa J

Não sei se esta minha visão dos parques infantis será partilhada por muitos pais e atenção que eu não sou contra eles, apenas gostaria de ver toda a gente a usá-los de uma forma civilizada. Parecendo que não, mas a partilha destes lugares, o saber esperar pela sua vez, o uso correto dos seus equipamentos poderão ser as bases para futuros cidadãos mais conscientes dos direitos e deveres de quem usa espaços públicos.

Eu, por cá, vou continuar a odiar estes espaços, mas a ter de os frequentar com a Luísa durante muuuuuuuitos anos.